29 maio 2014

Biblioteca da União



Brevemente à sua disposição na Biblioteca da União, no Colmeal, um livro que lhe aconselhamos vivamente. PORTUGAL O Sabor da Terra é uma excelente obra de autoria de José Mattoso, Suzanne Daveau e Duarte Belo.

Do seu Prefácio retiramos “Em termos de «identidade», nada é simples. Vamos abandonar a o nosso território? Vamos esquecer a terra? É nela que nos apoiamos, dela que nos alimentamos, ela que configura o nosso espaço, ela que condiciona as nossas comunicações físicas.
Nela moraram os nossos antepassados. Marcados pelo território, transmitiram-nos as estruturas sociais com que nos organizamos, as técnicas agrícolas que em parte a dominam, e tudo o mais que foi moldando as nossas comunidades até hoje. O território é o elemento permanente da identidade. Por isso acentuámos a presença da terra e procurámos, por meio da fotografia de paisagens e monumentos, representar os sinais de permanência ou da longa duração. É verdade que estamos cada vez menos condicionados pela Natureza. Mas talvez seja sensato não a ignorar. (…) Apesar de a etnografia se tornar uma disciplina cada vez mais «arqueológica», nem por isso se podem esquecer os dados que fornece, aliados aos da geografia e da história regional. Por outro lado, há uma história nacional que só se compreende devidamente quando se tem presente a diversidade de comportamentos próprios das regiões, e a influência que estes tiveram nas alterações de rumo do país. (…) Voltamos, assim, a juntar a nossa voz ao coro dos portugueses, que persistem em tentar perceber-se a si mesmos.”

No capítulo que se refere á Beira Litoral (págs. 275/319), para além do riquíssimo texto pode encontrar fotografias antigas que lhe mostram a Mata da Margaraça, povoações da serra do Açor, o real Neveiro, o Talasnal ou Góis, “que se situa na margem direita do rio Ceira, a montante de uma pequena várzea, no sopé do monte Rabadão. Ainda consideradas pertencentes à Beira Litoral pela proximidade de Coimbra, as vilórias do sopé da cordilheira Central, já possuem toda a rudeza das terras da Beira Interior. Quem de Coimbra se dirigir para Castelo Branco, inicia aqui a travessia de dois recortados alinhamentos montanhosos entre os quais corre, em vale cavado, o rio Zêzere. É uma estrada sinuosa e demorada, lugar de serranias solitárias.”

… “Quanto ao Pinhal Interior Sul, os problemas são bem diferentes. A gente das serras do Zêzere pensou ter encontrado no fim do século XIX e meados do século XX uma nova riqueza com a mineração do volfrâmio. Nas minas isoladas da Panasqueira chegaram a trabalhar mais de três mil operários. Mas a miragem acabou, aparentemente sem deixar benefícios duradoiros para a áspera região em que surgiu. Ficaram as histórias de mineiros, com a memória do seu duro trabalho, e as narrativas das aventuras de contrabandistas. Com o aproveitamento do volfrâmio para fins militares durante a Segunda Guerra Mundial, multiplicaram-se os obscuros negócios da venda oculta a uns ou outros dos países beligerantes. Apareceram os novos-ricos, que fizeram fortuna de um dia para o outro, e depois a perderam, com a mesma rapidez; pelo meio, as vinganças, fraudes, perseguições e peripécias que a ganância sempre traz consigo.

Depois do volfrâmio veio o pinheiro. A madeira constitui hoje uma quase monoprodução regional, o que não pode deixar de trazer um sério problema para a região. Este resulta dos efeitos que a falta da organização da produção e da comercialização impõe a uma economia deste género, e dos interesses desencontrados que ela suscita. Acresce o aspecto mais conhecido e dramático desta monocultura, que são os incêndios. Num clima regional muito seco, marcado por Estios quase sempre prolongados e escaldantes, os incêndios são um flagelo terrível, com consequências devastadoras não só pelos prejuízos económicos que acarreta, mas também pela perturbação e desânimo que traz às populações daquela área.

Considerada como uma das regiões europeias mais favoráveis à produção florestal, a zona do Pinhal Interior precisaria, para tirar um efectivo proveito da matéria-prima que produz, de criar uma melhor estruturação interna. Ora as serras do Zêzere são hoje uma das regiões mais despovoadas de Portugal. A circulação é aí lenta e difícil. A sua maior riqueza, o rio, com as suas águas abundantes e puras, deixou de ter qualquer significado para a região a partir dos anos 50 do século XX, quando foram captadas e armazenadas em grandes albufeiras, que só beneficiam a região de Lisboa. Destinadas, primeiro, a fornecer electricidade às indústrias da margem sul, servem hoje principalmente para abastecer a região Metropolitana de Lisboa de água de boa qualidade.

Sendo um lugar de encontro entre correntes de civilização vindas do Norte ou do Sul, e ao mesmo tempo uma zona de transição climática, não admira que a Beira Baixa, abandonada pelas grandes formações políticas medievais durante um período tão longo, se tivesse tornado um reservatório de formas arcaicas da vida rural. Foi aí, de facto, que se manteve mais tempo a transumância de Inverno do gado lanígero descido da serra da Estrela. Aina se praticava nos anos 50 do século XX.”

in Portugal – O Sabor da Terra, pags 392/393 - Março 2011 - Temas e Debates – Círculo Leitores
   

1 comentário:

Mariana Brás disse...

Excelente Aquisição!